23 dezembro 2006

Escravos do sonho e do medo*

Celina Santos

Dia 23 de dezembro. Hora de fazer as contas e correr à rua para comprar os presentes de Natal! Afinal, durante a semana não dá tempo para ficar vagando pelo comércio, à procura de promoções e descontos que nos permitam começar o Ano Novo um pouquinho mais folgados nas finanças. É preciso correr, senão não aproveitamos as melhores oportunidades, não é?

Tudo bem. Não há como fugir do lugar-comum. Nesta época, pensamos principalmente na troca de presentes e na farta ceia que nos alimentará na noite de 24 de dezembro. Mas, que tal tentar sair dessa esfera e pensar também em nos presentearmos com um pouco mais de cuidado com nossas vidas?

Vamos olhar para trás e analisar o que fizemos ao longo do ano. De um modo geral, o cotidiano das pessoas é regido por um ritmo ultra-acelerado. É acordar cedo para trabalhar, correr para estudar à noite, invadir a madrugada fazendo atividades escolares, usar os finais de semana para fazer aquela pós-graduação imperdível ... E por aí vão sendo consumidas as horas, os dias, as noites, os meses, o ano.

Estamos na era da automatização, da substituição cada vez mais constante do homem pela máquina e, com isso, a corrida pelo famoso “lugar ao sol” muitas vezes impõe um comportamento mecânico. É a tentativa de driblar o tempo e fazer tudo que julgamos fundamental para alcançar nossos objetivos.

Acabamos nos tornando escravos do sonho de crescer profissionalmente, escravos do medo de perder para o concorrente, escravos da lógica que dita: descanso é coisa de preguiçoso. O resultado disso é que o estresse é uma das doenças mais comuns nos dias de hoje.

De tanto corrermos e ligarmos os botões da ansiedade, que nos transformam em falsas máquinas, chega a um ponto que nossa coluna vertebral pede menos, nossa mente pede sono, nossos braços e pernas pedem apenas para bailar, ao ritmo de uma música lenta ou até mesmo na levada de um pagodão (risos).

Então, vamos combinar juntos esse presente de Natal? Vamos pensar mais nos momentos de lazer, investir no prazer, na alegria, na qualidade dos nossos dias. Não vamos permitir que o ano passe por nós como um furacão, deixando apenas a impressão de que não fizemos nada. Precisamos lutar por momentos mais marcantes, por horas que se façam inesquecíveis em nossa memória. Chega de correr feito loucos para chegar, antes de tudo, na reta final do cansaço.

Podemos nos prometer algumas coisas? Ok. Vamos ler mais, dançar mais, cantar mais no banheiro, abraçar mais nossos amigos e familiares, vamos ver o pôr do sol na beira da praia, ver o amanhecer do dia ao sair de uma farra, vamos zelar também pelo descanso em meio ao turbilhão de responsabilidades que norteiam nosso cotidiano.

Se for preciso, cancelemos ao menos por um dia nossos compromissos inadiáveis para pensar em nós. Que no próximo ano nós aprendamos a filtrar, sobretudo, o que há de melhor nessa longa caminhada batizada como vida.

*Publicado no Diário do Sul. Clique a q u i e leia mais.

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