14 janeiro 2007

As mil vidas de Manoel Leal

Por Daniel Thame

Mil edições, mil semanas. Um marco histórico para um jornal que há quase duas décadas é uma referência na imprensa regional. Um jornal diferenciado sob todos os aspectos, daqueles que, além de papel e tinta, trazem algo imensurável.

A Região não é feito apenas de notícias, ainda que sua especialidade seja a informação exclusiva, a coragem de denunciar e enfrentar poderosos, a resistência às perseguições políticas e econômicas. É um jornal feito com alma.

Nessas edições (1000 edições!) está a alma de Manoel Leal, tombado numa noite de verão de janeiro, vítima de seis tiros covardes, disparados por um pistoleiro contratado por pessoas mais covardes ainda, acobertadas por uma impunidade que perdura até hoje.

Manoel Leal, idealizador, fundador e mentor de A Região, jornal que acabou sendo sua razão de viver e morrer. E que, de uma certa forma, venceu a própria morte para se perpetuar em cada linha, em cada reportagem, em cada página, em cada edição.

Durante dez anos fui parceiro, testemunha e não raramente cúmplice do estilo Manoel Leal de fazer jornal, que transformou A Região em leitura obrigatória, que rendeu amigos e inimigos. Amor e ódio.

Era impossível ficar impassível diante de um jornal que, a começar por Malhas Finas que hoje parecem peça de antologia, trazia algo raro no jornalismo-release de hoje: reportagens.

Algumas, no limite na irresponsabilidade, como a denúncia de fraude, imediatamente comprovada, no Vestibular da Uesc.

Outras hoje soam quase como arroubos quixotescos, como a tentativa de impedir por meio da força do jornal o desembarque de cacau importado no Porto de Ilhéus, golpe mortal na auto-estima de uma região acostumada a exportar os até então frutos de ouro.

Reportagens quase proféticas como aquela que, em letras garrafais, trazia o título ACABOU, abrindo os olhos para uma realidade que ninguém queria enxergar: o fim do ciclo do cacau.

Reportagens que mudaram o curso da história, como a denúncia de tráfico de menores para a Europa através de um esquema de adoções que havia se transformado num negócio rendoso para juizes, advogados, comerciantes.

E uma anti-reportagem que nunca desejamos que fosse publicada, sem nenhuma linha de texto, mas que falou por milhões de palavras.

Uma foto 3x4 de Manoel Leal em meio a uma capa de jornal toda branca. E a página 3, na única vez em que não trouxe as impagáveis e demolidoras malhas finas, toda em negro, com seis buracos. Representando os seis tiros que mataram Leal.

Para os algozes, parecia o fim.

De Manoel Leal e, por extensão, do jornal.

Foi um recomeço.

Clique a q u i para ler o artigo na íntegra.

Nenhum comentário: