28 agosto 2007

Cacau

Há pouco mais de 10 anos, quando chegou ao Porto de Ilhéus a primeira carga de cacau importado da Indonésia, uma espécie de ´Exército de Brancaleone´, formado por produtores, empresários e líderes de entidades de classe, se postou em frente ao navio Emenkraft, tentando impedir o desembarque das amêndoas.

A importação dos primeiros grãos de cacau para uma região que se gabava de ser, até pouco tempo atrás, a maior produtora do planeta, foi um golpe não apenas econômico, mas atingiu fundo a auto-estima.

Era mais do que um sinal, mas a maior das evidências do estrago provocado pela vassoura-de-bruxa, doença em que curto período devastou os cacaueiros e mergulhou o Sul da Bahia na pior de suas crises, gerando uma legião de produtores endividados e uma multidão de trabalhadores rurais desempregados.

Invertia-se ali um ciclo, virava-se uma página, embora muitos continuassem acreditando que a queda da safra era uma coisa passageira, que os “anos dourados” voltariam, trazendo consigo todas as riquezas de um fruto que já foi de ouro. Literalmente.

O trem da história, pelo menos no caso (ou no ocaso) do cacau, não andou em círculos. Seguiu em frente e apesar de todas as tentativas de controlar a vassoura-de-bruxa, dos investimentos em pesquisas que resultaram em clones resistentes, a produção jamais atingiu os níveis anteriores à VB e a importação, que deveria ser passageira e circunstancial, tornou-se rotineira, para abastecer as indústrias processadoras, sob pena de, ao desemprego no campo, somar-se o desemprego nos núcleos urbanos.

De qualquer maneira, a importação de cacau servia apenas para complementar a produção baiana, que no início desta década chegou a dar alguns saltos, realimentar esperanças, embalar sonhos (ou seriam delírios?).

Pois bem: o ano de 2007 está prestes a produzir um cataclisma de simbologia amarga. Se as previsões dos produtores e industriais estiverem corretas -e tudo indica que estão- o Sul da Bahia deverá produzir cerca de 100 mil toneladas de cacau. E importar, pelo menos, 110 mil toneladas.

Os números não mentem. Pela primeira vez na história, a importação vai superar a produção total de cacau da Bahia.

Não é difícil imaginar o impacto da queda na produção na economia regional, especialmente nas pequenas e médias cidades, já que Itabuna e Ilhéus se tornaram pólos comerciais, prestadores de serviços, de saúde e de ensino superior. Ainda assim, não ficarão imunes, pois têm como público-alvo moradores dos municípios totalmente dependentes do cacau.

Não é o apocalipse, nem o final dos tempos.

Também não é o caso, como manda a velha e nem sempre boa tradição grapiúna, de sair promovendo uma caça às bruxas. Destas, já basta a da vassoura.

É o caso, sim, de criar condições para o aumento da produção em patamares realistas, investir em diversificação e explorar potencialidades historicamente desperdiçadas como o turismo, a agroindústria, os biocombustíveis.

Isso passa por mobilização, mudança de mentalidade, políticas públicas eficazes, investimentos. E trabalho, muito trabalho.

Não é, evidentemente, um caminho fácil.

Mas, é melhor do que ficar sentado à beira do caminho, esperando por milagres ou poções mágicas.

Porque, nisso, as bruxas são bem melhores.

Ou, piores.

Daniel Thame

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