02 setembro 2006

A PF e o álibi ético de Lula*

"Com a megaoperação deflagrada ontem pela Polícia Federal, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ganhou mais um trunfo na eleição deste ano.
Desarticulou um dos braços financeiros da facção criminosa PCC e, de quebra, "passou a perna" na polícia de São Paulo. A imagem que fica é a de que seu governo fez o serviço que a turma do secretário Saulo de Castro Abreu Filho -leia-se a turma do ex-governador e presidenciável Geraldo Alckmin (PSDB)- não conseguiu.
Mais do que isso, ao desbaratar a quadrilha de roubo a banco da organização criminosa, pode ainda ter tirado a sorte grande, fisgando um dos envolvidos no rumoroso seqüestro do jornalista Guilherme Portanova e do auxiliar técnico Alexandre Calado, da TV Globo.
Pouco importa que a Polícia Federal esteja há mais de um ano literalmente correndo atrás da quadrilha, a mesma que furtou o Banco Central de Fortaleza (CE), e que até agora não tenha conseguido recuperar quase nada.
Dos R$ 164,8 milhões furtados no maior assalto da história do país, apenas R$ 18 milhões foram resgatados pela Polícia Federal. Alguns dos quais, é necessário lembrar, achados por garotos depois que uma bola de futebol caiu numa casa abandonada. Uma piada.
Em ano de eleição presidencial, o que vale mesmo é o marketing político, o discurso. Lula, que já tem enorme vantagem nas pesquisas sobre Alckmin, ganhou mais essa.
Feriu o PCC e esvaziou a constatação tucana -verdadeira- de que a facção criminosa nascida nas penitenciárias do Estado se fortalece com as armas e drogas que a PF não vê passar pelas fronteiras.
Entre janeiro e julho, vale o registro, foram apreendidas apenas 107 armas -coincidência ou não, fronteira é um assunto que não dá tanta mídia.
O presidente da República, que não tem respostas para o mensalão e para as incontáveis denúncias contra a velha companheirada do PT, prefere se agarrar às espetaculosas ações especiais da PF -de janeiro de 2003 até o início de agosto já foram quase 280 (no segundo mandato de FHC, cerca de 60).
Se o Bolsa-Família é o principal cabo eleitoral de Lula, as operações da PF se transformaram no seu contra-argumento, no seu único álibi ético."

* Análise de Rogério Gentile, editor do caderno Cotidiano, da Folha de São Paulo.
Publicada na FSP deste sábado.

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