15 janeiro 2008

Manoel Leal

Daniel Thame

Há exatos 10 anos, num início de noite de verão, Manoel Leal foi covardemente assassinado quando chegava à sua residência, num bairro tranqüilo na periferia de Itabuna.


Foram seis tiros, disparados com precisão de profissional, que calaram para sempre um dos mais combativos, controvertidos e corajosos profissionais da imprensa sul-baiana.

Um assassinado planejado e friamente executado, com todas as características de crime de mando, já que à época o jornal A Região, do qual Manoel Leal era o diretor e mentor, vinha publicando sucessivas denuncias, todas elas documentadas, contra autoridades envolvidas em atos ilícitos.

Foi a chamada morte anunciada, tantas foram as insinuações e ameaças veladas e/ou nem tanto.

A morte de Manoel Leal, ao contrário do que seus algozes imaginavam, não produziu o silêncio esperado.

O crime ganhou repercussão internacional, mobilizou entidades como Repórteres Sem Fronteiras (França), Comitê de Proteção aos Jornalistas (EUA) e Sociedade Interamericana de Imprensa.

Conseguiu, inclusive, levar dois dos suspeitos a júri popular, algo raro numa Bahia onde na década sangrenta de 90, dez profissionais de imprensa foram assassinados.

Um, o policial civil Mozart Brasil, foi condenado, mas logo ganhou a liberdade e até hoje continua nos quadros da Secretaria de Segurança Pública da Bahia. Outro, Marcone Sarmento, foi absolvido, num julgamento que produziu cenas insólitas, como a nada discreta comemoração de alguns jurados após a divulgação do resultado.

Mas, a despeito de toda a mobilização, o assassinato de Manoel Leal gerou a anomalia de um crime de mando sem mandante. Ou, pelo menos, sem que a polícia tenha sequer ventilado os nomes dos eventuais mandantes, embora até as pedras do Rio Cachoeira soubessem, à época, a quem interessava calar o jornalista.


Investigações mal conduzidas, desconsideração de pistas importantes, negligência ou conivência mesmo. Tudo isso contribuiu para que, dez anos depois, os responsáveis pelo assassinato de Manoel Leal continuem impunes, desfrutando a vida que não permitiram ao jornalista, já em sua fase outonal e com sérios problemas de saúde, viver ao lado dos familiares e amigos, exercendo a atividade que era sua razão de viver.

E que foi a sua razão de morrer!

Convivi com Manoel Leal no dia a dia de A Região durante dez anos, num misto de paixão e, não raro, uma certa dose de insanidade em fazer um jornal a quem ninguém ficava indiferente. Admirei suas imensas virtudes e compreendi seus eventuais defeitos.

Compartilhamos as alegrias, tristezas, ansiedades, dificuldades e a certeza de que, acertando e errando, fazíamos, juntamente com uma equipe brilhante e cheia de garra, um jornal que mais do que papel e tinta, tinha alma.

Nos últimos dez anos, tenho procurado preservar a memória de Leal, na convicção de o esquecimento só favorece os covardes sanguinários que lhe tiraram a vida.
Mais que a saudade do “velho Capo”, dói mesmo é constatar que aqueles tiros disparados no distante 14 de janeiro de 1998 ainda ecoam como símbolo de uma impunidade inaceitável.

Um crime ainda sem castigo.

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