06 março 2007

Na casa de Pai Caló



Gerônimo de Oxóssi


Tava de espírito preocupado, meio cismático das idéias, quando resolvi procurar meu velho amigo e conselheiro, Pai Caló. Ele é um babalorixá que vive nos arredores de Itabuna, entre a estrada do anel quebrado e a ponte do lugar nenhum.

Se quiser encontrar a casa de Pai Caló, é só procurar a que sai fumaça da janela. O amigo nunca conseguiu se livrar daquele charuto fedorento, mas com o tempo a gente se acostuma com a inhaca.

Faço uma reverência na chegada e vejo o velho sentado em sua rede, um lugar do qual parece jamais sair. Ele nem abre os olhos e me cumprimenta:

- Como vai você, mizifiu?. - Um desavisado pode imaginar que ele não vê, mas o baba tem a estranha capacidade de enxergar com os olhos fechados.

- Vou bem, mas ando meio cismado - digo.

Ele não pergunta o motivo da cisma, é do tipo que dá sentença sem investigar o caso. Eu penso: "Esse homem tem ISO-9001 em macumba" e percebo um sorriso discreto no baba, que parece também ouvir pensamento. Em poucas frases, ele espanta as nuvens da minha cabeça.

- Mizifiu, você siga em sua canoazinha, que o Titanic já afundou. Aqui em Tabocas tem chovido muito e há uma determinação de Oxum. Mamãe decretou que vai entrar água em todo lugar que tem ladrão - diz Caló, que arremata:

- O caso da senzala de Ferradas foi só um aviso!

Eu compreendo a mensagem e Caló baixa a cabeça, dando a consulta por encerrada. Antes de sair, comento:
- Pai Caló, eu vi uns despachos no caminho e percebi que os ebós estão meio pobres. Tão colocando caldo Maggi no lugar da galinha preta.

O velho ficou com a cara mais enrugada e respondeu:

- Mizifiu, o homi já tinha acabado com pó de mutamba e óleo de peroba e agora faz tanta encomenda a Exu, que tá tendo engarrafamento na encruzilhada.

Vi o velho sumir na fumaça e fui embora.

Nenhum comentário: