18 março 2008

Brasileiros barrados na Espanha: agora, sim, começou a repercutir

Luciano Reis Porto
De Madri, especial para o Pimenta

Já faz algumas semanas que a mídia brasileira começou a por em evidência a situação preocupante dos brasileiros que chegam à Espanha, em virtude do rigor imposto pelas autoridades locais no controle de chegada. O número de brasileiros barrados no Aeroporto Internacional de Barajas (Madri), desde o início do ano, soma já mais de 1.000, segundo dados do Consulado-Geral do Brasil.

Relatos de vexações, humilhações, maus-tratos por parte da polícia espanhola são fatos recorrentes. Algumas situações beiram ao cárcere privado, por conta de as pessoas passarem horas e horas trancadas, sem comunicação e sem comida e água. Tudo isso já era conhecido por todos os brasileiros que vivem ou chegam a Madri desde há muito tempo.

Precisou acontecer aquele fato com os dois estudantes de mestrado do Rio de Janeiro, filhos da classe média carioca, para que as autoridades brasileiras tomassem medidas. Enquanto só os trabalhadores sofriam abusos, pairava a invisibilidade. Mas menos mal que se começou a reagir.

Eu cheguei a Madri no mesmo dia do vôo dos estudantes, só que algumas horas antes. Por ter visto de estudos, não tive nenhum problema. No entanto, empresários do Recife, que vinham participar de um congresso, quase ficam retidos, mesmo apresentando todos os requisitos pedidos: passagem de ida e volta, reserva em hotel, dinheiro suficiente para os dias da estância, inscrição no congresso, etc.


Precisamos (digo "precisamos", porque fiquei com eles, visto que não falavam o castelhano) gastar muita saliva junto às autoridades para convencer de que o grupo não tentava viver ilegalmente no país. Mas, mesmo assim, ficaram retidos umas 4 horas.

Este é o receio: de mais imigrantes. Como a Espanha é porta de entrada para a Europa, a UE (União Européia) exige que o governo espanhol endureça sua política de imigração. O caso brasileiro é peculiar, pois passou-se de uma natural flexibilidade para a entrada em solo espanhol a uma restrição extremada.

"Espanha barrava 20 brasileiros/mês.
Hoje, são 30... por dia!!!"

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Para se ter uma idéia, segundo o Consulado Brasileiro, em 2006, o número de barrados ficava em torno de 20 por mês, enquanto que em 2007 subiu para quase 200. A média desse ano é de mais ou menos 30 pessoas... por dia!!!.

Sem querer entrar numa abordagem mais ampla, tocando em causas, motivos, justificantes da emigração brasileira à Espanha, queria mencionar a repercussão dessa "crise" aqui.

Até o dia de hoje, havia um silêncio
total: nenhum meio de comunicação, nenhuma entidade governamental, nenhuma associação de imigrantes tocava no assunto. Apenas nós, do Núcleo do PT de Madri, insistíamos em denunciar ao embaixador José Viegas e ao cônsul-geral, Gelson Fonseca Jr. Inclusive abordamos o tema com o presidente Lula, em encontro com os militantes petistas, na sua última viagem a Madri.

Agora que o Brasil adotou o princípio da reciprocidade, começaram a aparecer notícias na mídia. Hoje, todos os telejornais e jornais dedicaram boa parte de seus espaços à "crise" entre Espanha e Brasil, por conta do quanto sucedido em Recife.

Exemplo disso é o Jornal El País dessa terça-feira que traz a manchete "Brasil retém em um aeroporto mais de 400 espanhóis", em referência ao vôo de uma companhia argentinha que ia para Buenos Aires e que, por motivos técnicos, teve que fazer escala em Recife. A matéria ainda menciona a nota divulgada pelo Ministério do Interior, recomendando cuidados especiais para quem deseja ir ao Brasil.
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O interessante dessa matéria foram os comentários dos internautas – um reflexo da percepção da população (que lê jornal) sobre o tema do endurecimento do controle sobre os brasileiros. Foi a matéria mais comentada do diário. Suscitou mais de 400 mensagens, em sua extrema maioria apoiando a decisão do governo brasileiro e reconhecendo os excessos das autoridades espanholas.

Assim, também por essas bandas a situação passa, aos poucos, a ser de conhecimento público e vamos ver os desdobramentos dessa questão. Há quem acredite que o governo espanhol, a exemplo do que já fez com outros países da América Latina, vá passar a exigir, em todo e qualquer caso, visto de entrada para os brasileiros.

Enquanto isso não acontece, para quem deseja passear na Espanha, a sugestão é ler atentamente todos os requisitos e observá-los integralmente. E por precaução, tenha os números de contatos do Itamaraty e do Consulado do Brasil em Madri (celular: 0 xx 34 677 547 004).

Luciano Porto Reis é advogado, sul-baiano, e faz mestrado na área de Direito, em Madri.

Um comentário:

Edna disse...

Quero aqui parabenizar o Luciano pela excelente clareza dos fatos relatados na matéria e também pelo ato solidário com os empresários. Imagino a dificuldade que os brasileiros estão passando em terras espanholas, diante de tanta perseguição.Creio que o governo brasileiro realmente precisa adotar medidas que assegurem tratamento parecido aos espanhois, e se for necessário apertar o cerco contra a espanha, pois brasileiro não lixo, é gente que batalha e luta por seus sonhos e merece muito respeito.