14 outubro 2007

"O Código Penal é de 1940. Está velho e caduco"

Entrevista a Gustavo Atallah Haun*

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O promotor Carlos Eduardo Passos, nascido em Valença, em 1951, é um veterano nas lides jurídicas do estado da Bahia. Filho do ex-padre e professor Nestor Passos e de dona Yvette B. Lima Passos, tem no DNA a marca da inteligência, aliada à sensibilidade de um leitor voraz.

Sua incrível biblioteca contém mais de dois mil títulos, entre literatura forense e universal. Teve sua formação estudantil em escolas públicas e formou-se bacharel em Direito pela antiga Fespi, no ano de 1975. Dois anos depois já ostentava o cargo de Promotor de Justiça da Bahia.

Em 1987 recebeu o título de cidadão itabunense e no mesmo ano entrou para o corpo docente do Departamento de Ciências Jurídicas (Dcijur), da Universidade Estadual de Santa Cruz, ministrando aulas de Direito Penal, Direito Processual Penal, Temas de Direito Penal e Direito Penal Aplicado.

Também figura como membro da Academia de Letras de Ilhéus (1992) e membro do Instituto Histórico de Ilhéus (1995). Carlos Eduardo Passos é especialista em Processo Civil pela Uesc, 1996, e defendeu dissertação de mestrado em 2002, tornado-se mestre em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco. Vamos à entrevista:
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Gustavo Atallah Haun – Tendo atuado tanto tempo na Vara Criminal de inúmeras comarcas baianas, qual o problema mais sintomático dessas localidades em relação à criminalidade?
Carlos Eduardo Passos – O problema detectado diz respeito à falta de estrutura dos órgãos repressivos. Isso significa dizer que a POLÍCIA ainda não se encontra aparelhada suficientemente para o enfrentamento da criminalidade.
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GAH – Há solução para a diminuição da violência na região sul - baiana? Qual (is) a(s) causa(s) de tantos crimes por aqui?
CEP – Para a diminuição da violência sim, pois há diversas formas de minizamento de seus efeitos perversos. Quanto às causas, existem diversas, a começar pelo eterno problema da falta de condições existenciais mínimas à sobrevivência.
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Também existe ao seu lado a impunidade, falta de presença dos órgãos públicos e de políticas públicas visando a melhoria da população de baixa renda. Outrossim, o desaparelhamento da Polícia Civil, como já foi dito, e de meios exitosos para o combate ao chamado crime organizado.
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O troca-troca dos delegados obedece a uma sistemática própria

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GAH – Como o Ministério Público enxerga o troca-troca de delegados? Há uma máfia política ou mesmo corporativista nessa área sendo investigada pelo MP?
CEP – O troca-troca dos delegados obedece a uma sistemática própria, interna da Secretaria de Segurança Pública, não havendo nisso quaisquer interesses menores ou até mesmo criminosos. O Ministério Público vislumbra tais trocas naturais e lícitas, não havendo nenhuma intromissão de sua parte.
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GAH – Ficou famosa uma briga “profissional” entre o senhor e o antigo delegado Ludovico, foi isso que o fez se afastar da área criminal em Itabuna?
CEP – A “briga” motivou o meu afastamento da área criminal. Contudo, a ela estou retornando por força do acúmulo de serviço dessa área.
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GAH – É verdade que o Código Penal vigente, devido à sua defasagem, causa o que estudiosos jurídicos chamam de “inflação” criminal?
CEP – O nosso Código Penal data de 1940. Portanto, já está velho e caduco. Por isso mesmo os remendos são grandes, além de muitos dispositivos estarem sendo revogados por Leis esparsas. O ideal seria um novo Código Penal, inteiramente condizente às novas realidades.
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GAH – A respeito disso, como professor universitário especialista em Direito Processual Penal, o que há de mudanças previstas para uma real adequação do Código ao século XXI?
CEP – Existem diversas propostas que dormitam nas comissões de Reforma e na Comissão de Justiça da Câmara dos Deputados. Tais projetos alteram a substância filosófica do atual Código, como prova a descriminalização do aborto. O usuário de drogas também, depois da Lei 10.409/02, deixou de ser tratado como criminoso, a Lei substituiu a pena de prisão por medidas alternativas, como prestação de serviços comunitários e pagamento de multa. Isso é uma forma de “desinflacionar” o Código Penal.
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"O governo não quer gastar mais com
Segurança e com a Execução da Pena"
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GAH – O filósofo francês Michel Foucault, que estudou as prisões, afirmava que a ressocialização exige isolamento, trabalho e a modulação da pena de acordo com o comportamento. Por que isso não é seguido?
CEP – Preliminarmente porque o GOVERNO não quer gastar mais com Segurança e com a chamada Execução da Pena, construindo estabelecimentos penais em número suficiente, visando pelo menos reduzir a superlotação. Com isso, ele infringe a ideologia de prevalência dos Direitos Humanos, abraçada firmemente pela Constituição de 1988.
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Por que tal atitude? É aquela arrimada no mais puro FARISAÍSMO, FAZ DE CONTA, temos o sentenciado, mas não queremos a sua reinserção na sociedade.
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GAH – No livro Vigiar e Punir, Foucault diz que “a prisão deve ser concebida de maneira a apagar as conseqüências nefastas de reunir num mesmo local condenados muito diversos”. As cadeias brasileiras não são universidades do crime, mantendo-se contatos verticalizados com os que lá estão presos?
CEP – Concordo inteiramente com a visão do francês. Quem as visita sabe a certeza da ilação. Aliás, há muito tempo que estou descrente no seu poder intimidatório e regenerativo. Precisaríamos a respeito de um corte vertical e definitivo no trato do problema.
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GAH – Uma curiosidade de professor para professor: como têm chegado os estudantes de Direito nas universidades e como têm saído?
CEP – Ministro aulas nos semestres que antecedem a colação de grau. Existem altos e baixos, hão os interessados, diligentes, aplicados, e hão também em contrapartida os negligentes, aqueles que se matriculam apenas por uma questão, digamos assim, BUROCRÁTICA. Consoante os colegas, aqueles que dão aula nas turmas iniciais, existe muita dificuldade da parte da maioria do alunado em acompanhar o Curso.
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Contudo, tenho certeza de que já foi PIOR. Essa melhora se deve ao ERED, avaliações periódicas do MEC e ao decantado exame de ordem da OAB. Para encerrar, tenho alunos brilhantes que lêem Dworkin, Saramago, Dostoievsky, Kafka e outros tantos. Dessa maneira eles concluem o curso de forma SATISFATÓRIA.
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*Professor.
(Publicada no Diário de Ilhéus, de 15 a 17 de setembro de 2007)

3 comentários:

Anônimo disse...

Que burrice... Não existe essa de código penal atrasado... não estamos mais na era da codificação!! basta apenas atualizar os institutos jurídicos.Através de leis especiais.E realmente é o que acontece. Agora , se falarem que o código de processo penal é arcaico.. tudo bem .. concordo! O problema de alguns " jornalistas " é a falta de conhecimento jurídico.

Anônimo disse...

Que burrice... Não existe essa de código penal atrasado... não estamos mais na era da codificação!! basta apenas atualizar os institutos jurídicos.Através de leis especiais.E realmente é o que acontece. Agora , se falarem que o código de processo penal é arcaico.. tudo bem .. concordo! O problema de alguns " jornalistas " é a falta de conhecimento jurídico.

Ricardo Ribeiro disse...

Quem afirma que o Código Penal é "velho e caduco" é o nosso promotor de justiça, caríssimo.

Aliás, e por isso, a afirmação está aspeada. Basta ler a entrevista!!!